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Vice-presidente da Fenafar escreve depoimento sobre Cuba

04/06/2014

O forte direcionamento das políticas de saúde voltadas para a atenção primária, notadamente com ações de promoção da saúde e prevenção de doenças, explica os elevados índices de saúde dessa pequena ilha que possui população de pouco mais de 11 milhões de habitantes.

Ao visitar uma policlínica com atendimento de especialidades e urgências médicas, causou-nos enorme espanto constatar que não havia pacientes esperando por atendimento. Estivemos lá no período da tarde e, segundo o especialista que nos atendeu, Dr. Manuel Betancourt, todos os pacientes tinham sido atendidos pela manhã. De fato, não trata-se apenas de uma questão de logística e sim fruto das profundas intervenções na atenção primária.

Cuba possui 5,71 médicos para cada 1000 pessoas. No Reino Unido, referência mundial em investimentos e avanços em saúde pública, essa relação é de 2,7 médicos. No Brasil, em 2013 existiam 1,89 profissionais para cada 1000 habitantes

O embargo econômico mais cruel e longo da história mundial

O bloqueio econômico imposto à Cuba pelos Estados Unidos desde o início da década de 1960 é uma das piores atrocidades internacionais e se torna mais cruel ainda ao determinar, por meio do princípio da extraterritorialidade, que qualquer empresa norte-americana ou filiais que se encontre em outro país, está impedida de ter quaisquer relações com Cuba. Para se ter uma ideia, antes da Revolução, 73% das exportações de Cuba eram para os Estados Unidos.

A última Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) votou pelo fim do embargo americano a Cuba pelo vigésimo segundo ano consecutivo e desta vez, 188 países votaram pelo fim do embargo americano contra Cuba. Apenas dois países dois países (EUA e Israel) foram favoráveis à manutenção dessa situação absurda.

No entanto, apesar de o "mundo inteiro" ser contrário ao embargo econômico, os Estados Unidos continuam sua política esquizofrênica de retaliação a quem queira manter alguma relação com o povo cubano, a ponto de impedir a comercialização em terras americanas de todo produto que possa ter tido alguma origem ou ingrediente cubano, independentemente da empresa que o produza.

Essa política reduz significativamente qualquer relação econômica de Cuba com os países com os quais mantém acordos comerciais e gera enormes dificuldades ao não possibilitar acesso a materiais e produtos básicos e de primeira necessidade para o dia a dia. A produção agrícola sofre pela falta de mecanização, a indústria não avança por falta de máquinas modernas e produtivas, há necessidade de racionamento de água e luz por deficiência de equipamentos e o acesso à internet, por exemplo, é caro, limitado às universidades, setores do governo e nos hotéis.

Assistência farmacêutica em Cuba

Não poderia deixar para trás a oportunidade de visitar, sem agendar, uma farmácia em Cuba. Ao entrar em uma farmácia no centro de Havana, capital com uma população do tamanho de Belo Horizonte, cerca de 2,5 milhões de habitantes, de cara observei que a farmácia tinha nome genérico ? Farmácia - sem nenhuma complementação.

O farmacêutico, único funcionário do estabelecimento, atendeu-nos com presteza e ao identificar-me como farmacêutico do Brasil, mostrou toda disposição em responder a qualquer pergunta. Informou que estudou na Universidade de Havana, que o curso dura cinco anos e que ele e outro colega farmacêutico atendem naquele estabelecimento cada um por oito horas.

A farmácia e os dois farmacêuticos prestam assistência a uma população circunscrita e atendida por 05 (cinco) consultórios médicos localizados nos arredores daquela farmácia. Os pacientes são cadastrados, em pastas físicas, onde consta relação dos pacientes que utilizam medicamentos de uso contínuo. Atividade semelhante aquelas realizadas em nossas farmácias de unidade básicas de saúde.

Ao perguntar se poderia adquirir um analgésico, o farmacêutico disse que sim e perguntou pela receita. Ao informar-lhe que queria "apenas" um analgésico comum ele prontamente perguntou se eu queria o endereço do médico mais próximo e que a consulta seria rápida e não custaria nada. Ele me mostrou analgésicos, anti-inflamatórios, antibióticos, aerossol, com embalagens simples, todos fabricados pela estatal cubana. Em Cuba não existem MIP"s.

Naquele mesmo dia, à noite, ao encontrar-me com uma amiga cubana apresentada pela colega Gilda Almeida, fiquei curioso em saber se ela tinha medicamentos em casa e para minha surpresa e teimosia ela disse que não e se precisasse seria mais fácil procurar o médico à noite, pois não haveria fila e seria atendido rapidamente por um médico e ficaria mais tranquilo, já que ela não sabe fazer diagnóstico e poderia medicar de forma incorreta. Ela confirmou o que o farmacêutico tinha dito e eu custei acreditar.

Por conta do embargo econômico, a população sofre por não ter acesso aos medicamentos fabricados por multinacionais que sofrem a pressão americana. Segundo o colega farmacêutico, alguns países europeus, citou a Espanha, possui uma relação mais ampliada de onde exportam vários medicamentos. Do que observei nas prateleiras daquela farmácia do centro de Havana, prevaleciam principalmente poucos antibióticos, analgésicos, anti-inflamatórios e hormônios contraceptivos. Obviamente, não havia nenhuma propaganda e nem produtos não correlacionados à saúde expostos no estabelecimento.

O Primeiro de Maio em Cuba

No dia primeiro de maio, fomos avisados pelos organizadores do encontro sindical que teríamos de sair às 06 horas da manhã do hotel para conseguirmos um lugar nas arquibancadas, na Praça da Revolução, por onde passaria a marcha do dia do trabalho. De fato, a arquibancada estava cheia de sindicalistas e convidados que vieram de diversas partes do mundo para a grande festa do primeiro de maio em Cuba.

No entanto, ficamos muito impressionados com a quantidade de pessoas que participaram da marcha. Mais de um milhão de cubanos e cubanas de todas as faixas etárias fizeram-se presentes e não deixaram nenhuma dúvida quanto ao forte sentimento de apoio à luta e à revolução cubana.

Vale destacar também a organização do evento. Sem exagero, após duas horas e vinte minutos do início da marcha, a grande multidão já tinha passado e o evento já tinha se encerrado. Sem confusão, sem atraso, já estávamos liberados para conhecer a sede campestre da Central de Trabalhadores de Cuba (CTC).

O VI Encuentro Sindical Nuestra América (ESNA)

A escolha de Cuba para a VI edição do ESNA representou a expressão de solidariedade com o povo e a Revolução Cubana. Além dos atos do 1º de maio, o evento também se deu no contexto das comemorações pelos 75 anos da CTC. O ESNA também se constituiu como uma oportunidade para que o movimento social e sindical da América Latina realizasse debates sobre a situação sociopolítica que vive o mundo, avaliando e propondo alternativas para enfrentar os impactos originados pela crise que vive o sistema capitalista atual e definindo os desafios que devem assumir as organizações sindicais.

O VI ESNA que teve como subtítulo: " Defender nossos direitos e aprofundar as mudanças", foi marcado por grande presença das principais entidades representantes dos trabalhadores dos diversos países do mundo, incluindo africanos, asiáticos, europeus e todos os países das Américas do Norte, Central e Sul. Compareceram 86 entidades abrangendo 486 sindicalistas. Os sindicalistas presentes debateram quatro grandes temas e ao final apresentaram as propostas de resoluções que foram debatidas e aprovadas em plenária final. Os grandes temas debatidos foram: 1) La crisis actual del sistema capitalista y los retos para el movimiento sindical en el continente; 2) La agenda sociopolítica del movimento sindical. Integración de los pueblos, lucha anti neoliberal y anti-imperialista; 3) El fortalecimiento de las organizaciones sindicales para el desarrollo de su agenda sociopolítica; e 4) El programa de formación, investigación, asistencia técnica del ESNA. A seguir apresento, na íntegra, algumas resoluções aprovadas que refletiram bem o espírito e propósitos do VI ESNA: "Respaldamos un sindicalismo no sólo reivindicativo, sino sociopolítico, que debe tener como meta la transformación de la sociedad en beneficio de los trabajadores y de todo el pueblo". "La educación y la salud para el pueblo, contra su privatización y mercantilización." "Fortalecer el papel del estado en el desarrollo económico social, con políticas que generen empleos e inclusión social, sobre todo para los jóvenes". "Rechazamos la criminalización y limitación de la lucha social y exigimos el pleno ejercicio de los derechos sociales, políticos y sindicales". Cuba é realmente um País instigante. Para tentar entendê-lo e entender o seu povo, é preciso visitá-lo. Contudo, é preciso visitá-lo com o espírito aberto a um outro "modus vivendi". O que vi, andando pelas ruas de Havana, foram pessoas sorridentes, alegres, simples e solidárias, parecidas com o povo brasileiro e que, como nós, precisa de muito pouco para ser feliz.

*Rilke Novato Públio é Vice-Presidente da Fenafar e Diretor do Sinfarmig

Publicado em 30/05/2014


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